Os consumidores mais jovens são os que mais escolhem essa forma de pagamento, porque são os que têm a renda mais baixa. Vendas parceladas no cartão de crédito tendem a crescer nos EUA
A guerra tarifária tem potencial para aumentar a inflação nos Estados Unidos - e também para estimular uma forma de compra que os brasileiros conhecem muito bem.
A inflação nos Estados Unidos tem um histórico bem mais comportado do que conhecemos no Brasil. De 2015 até 2020, por exemplo, o acumulado do ano não passou muito de 2%. Por isso, a meta do Banco Central americano é de 2%.
Com a crise na cadeia de suprimentos que assolou o mundo depois da pandemia, os preços nos Estados Unidos saíram de controle, e a inflação atingiu um pico de 9,1% em junho de 2022. Nos últimos três anos, foi caindo aos poucos e só recentemente voltou a ficar abaixo dos 3%.
O susto que os americanos tiveram com a alta dos preços ainda está longe de ser os brasileiros sentíamos na época da hiperinflação na virada dos anos 1980 para 1990, mas já foi o suficiente para mudar os hábitos do consumidor americano nas compras pela internet. Os parcelamentos sem juros - nossos velho conhecido e que nos Estados Unidos é novidade - começa a ganhar força. A diferença é que o parcelamento não é feito pelo cartão de crédito e, sim, por empresas conhecidas como “Buy Now, Pay Later” - ou “Compre Agora, Pague Depois” –, que debitam as parcelas direto da conta do cliente.
Nos Estados Unidos, consumidores aderem ao hábito brasileiro de parcelar compras
Jornal Nacional/ Reprodução
O professor Filipe Campante, da Universidade Johns Hopkins, chama esse fenômeno de latino-americanização das compras:
“Uma parte desse processo de parcelamento é que a gente conhece no Brasil, a pessoa que não tem talvez o recurso para comprar, para fazer uma compra mais volumosa de uma vez, mas a parcela cabe no orçamento. Então, você tem o surgimento desse tipo de serviço para procurar atingir essa parcela. Então, acho que são reflexos desse aumento da incerteza. Essa ideia de que amanhã pode ser pior, então melhor fazer o hoje e aí tentar fazer da forma que der”.
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A Cody costumava comprar tudo no cartão de crédito, mas recentemente aderiu aos serviços de parcelamento. Primeiro fez um teste:
“Fiz uma compra pequena de US$ 50, porque desconfiei dos juros zero e pensei que ia ter alguma taxa extra no final. Mas funcionou, fiz compras maiores e achei prático que as parcelas são debitadas direto da conta bancária. E quando você quer uma coisa, quer na hora”, conta.
Segundo o Banco Central americano, o valor total de empréstimos para compras parceladas nos Estados Unidos era de US$ 2 bilhões em 2019. Em dois anos, cresceu 12 vezes e chegou a US$ 24,2 bilhões. Em 2023, subiu ainda mais até chegar a US$ 75 bilhões.
Nos Estados Unidos, consumidores aderem ao hábito brasileiro de parcelar compras
Jornal Nacional/ Reprodução
Os consumidores mais jovens são os que mais escolhem essa forma de pagamento, porque são os que têm a renda mais baixa, especialmente quem tem de 25 a 34 anos. A Cody tem 29 anos e ainda mantém a maior parte dos gastos no cartão de crédito. O parcelamento fica para aquelas compras que ela poderia adiar, mas não consegue resistir.
“Quando a gente se endivida no cartão de crédito, que tem juros altos, em 30 dias, a dívida fica enorme. Então, com a economia do jeito que está, é melhor pagar em parcelas fixas. Dói menos no bolso”, diz.
“Isso pode parecer piada, mas eu acho que é verdade mesmo. Eu acho que assim, eu como brasileiro nascido e criado no Brasil, como eu vim nos anos 1980, 1990, me sinto realmente com o nível de experiência que os americanos não têm”, afirma Filipe Campante,.
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