Posse do prefeito Marcelo Lima (Podemos) na Prefeitura de São Bernardo do Campo, em 1° de janeiro de 2025.
Divulgação/Câmara Municipal de SBC
Afastado do cargo após operação da Polícia Federal sobre esquema de corrupção, o prefeito de São Bernardo do Campo, Marcelo de Lima Fernandes (Podemos), estava há apenas oito meses na liderança política da cidade, mas é velho conhecido dos eleitores do ABC e da Grande São Paulo.
Deputado federal eleito em 2022 com 110.430 votos, ele foi vice do antecessor no cargo, o ex-prefeito Orlando Morando (PSDB), por dois mandatos. Os dois romperam no ano passado depois de uma briga na eleição.
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Primo do presidente da Câmara Municipal, Danilo Lima (Podemos), que também foi alvo da operação da PF nesta quinta-feira (14) – Marcelo Lima tinha experiência política e queria ser finalmente o prefeito da cidade.
Mas o tucano Orlando Morando insistia na indicação de um familiar para a disputa de seu espolio político em São Bernardo, após oito anos de administração da cidade.
O ex-prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando (PSDB), ao lado do seu ex-vice, Marcelo Lima (Podemos), que assumiu a cidade em janeiro deste ano,.
Divulgação/Prefeitura de São Bernardo
Como a esposa de Morando – a deputada estadual Carla Morando (PSDB) não podia ser a indica por veto da lei eleitoral, Orlando escolheu a sobrinha, Carla Morando para sucedê-lo, para fúria do vice.
Sem experiência alguma na política, Flávia era administradora do supermercado da família na cidade. Foi escolhida pelo tio para disputar a eleição de 2024.
Sem desenvoltura, ela não participou de nenhum debate público com os adversários e viu Marcelo Lima disparar nas intenções de voto no 1° turno, deixando a família Morando para trás, sem nem conseguir avançar para o 2° turno da disputa eleitoral.
No 1° turno, Lima obteve 28,6% dos votos e disputou a 2ª etapa da eleição contra o também deputado federal Alex Manente (Cidadania), que obteve 26,5%.
Flávia Morando ficou em 4º lugar, com 21,3% dos votos na disputa.
Flavia Morando recebeu apoio durante eleições dos tios, o prefeito Orlando Morando e a deputada Carla Morando
Reprodução/Redes sociais
No segundo turno, Orlando Morando voltou a se aproximar do vice e declarou apoio ao seu ex-vice de oito anos, mas sem assumir cargo na Prefeitura da cidade.
Ao invés disso, o tucano resolveu assumir o cargo de secretário de Segurança Urbana da capital paulista, a convite do prefeito Ricardo Nunes (MDB).
Lima venceu a eleição com 55,73% dos votos válidos, derrotando o candidato Alex Manente (Cidadania).
Resultado do 1º turno em São Bernardo nas eleições 2024:
Marcelo Lima (PODE): 119.593 votos, 28,64% dos votos válidos
Alex Manente (CIDADANIA): 110.791 votos, 26,53% dos votos válidos
Luiz Fernando (PT): 96.426 votos, 23,09% dos votos válidos
Flávia Morando (UNIÃO): 89.276 votos, 21,38% dos votos válidos
Claudio Donizete (PSTU): 1.507 votos, 0,36% dos votos válidos
Estratégia de vitória no 2° turno
Marcelo Lima (Podemos) e Jéssica Cormick (Avante) venceram a eleição de São Bernardo do Campo no ano passado com 55% dos votos válidos.
Reprodução/Instagram
Com poucos partidos na aliança política inicial, a estratégia de Lima para vencer o pleito na cidade foi se aproximar dos eleitores bolsonaristas e conservadores, chamando uma mulher e policial militar para sua chapa.
Alex Manente, seu adversário no 2° turno, era o candidato oficial do bolsonarismo na cidade, enquanto o candidato do PT era o deputado estadual Luiz Fernando, que ficou em 3° lugar na disputa.
A escolhida para vice foi a tenente Jéssica Cormick, que foi convidada a se filiar ao Avante pelo próprio Marcelo Lima. Ela agora assume a cidade, sem ter nenhuma outra experiência política anterior.
Os dois tomaram posse em 1° de janeiro e agora, oito meses depois do início do governo da dupla, Lima foi afastado do cargo acusado de ligações com um esquema de corrupção de empresas que prestam serviço para a prefeitura da cidade.
Segundo a PF, há indícios de corrupção e pagamento de propina em contratos com empresas nas áreas de obras, saúde e manutenção.
Prefeito de São Bernardo do Campo é alvo de operação da PF
Os federais apontam que Marcelo Lima era o líder e principal articulador do esquema. Ele exercia controle e supervisão diretos sobre o fluxo de recursos e a contabilidade informal da quadrilha, segundo o inquérito.
A propina era usada para pagar despesas pessoais do prefeito e de seus familiares, incluindo mensalidades de faculdade da filha, contas de consumo, faturas de cartão de crédito e despesas de viagem.
O operador financeiro do esquema era Paulo Iran Paulino Costa, funcionário da Assembleia Legislativa de SP. A PF diz que Iran era o operador financeiro do esquema e era responsável pela “arrecadação e distribuição de valores provenientes de diversas empresas com contratos com a Prefeitura de São Bernardo do Campo e a Fundação ABC”.
O esquema tinha ainda participação de Antônio Rene da Silva Chagas, que atualmente era diretor de Departamento na Secretaria de Coordenação Governamental da Prefeitura de São Bernardo do Campo. Ele atuava junto com Paulo Iran na arrecadação da propina junto às empresas.
O g1 procurou tenta contato com as defesas de Lima, Paulo Iran e Antônio Renê, mas ainda não obteve retorno.
Esquema descoberto
Prefeito de São Bernardo do Campo é afastado depois de operação da PF
A investigação começou após a polícia encontrar no mês passado cerca de R$ 14 milhões (considerando uma parte em dólar) com um servidor apontado como o operador financeiro do prefeito.
Segundo a PF, há indícios de corrupção e pagamento de propina em contratos com empresas nas áreas de obras, saúde e manutenção. Cerca de R$ 1,6 milhão foi apreendido nesta quinta com alvos diferentes, mas o trabalho de contagem ainda está em andamento.
A polícia chegou a requerer a prisão de Lima, mas a Justiça negou o pedido. No entanto, determinou o afastamento dele do cargo e o uso de tornozeleira eletrônica, que será colocada logo após as buscas na casa dele. Ele também está proibido de sair de casa à noite e nos finais de semanas, de ter contato com os demais investigados e de sair da cidade sem autorização judicial.
O atual presidente da Câmara Municipal da cidade e primo do prefeito, vereador Danilo Lima Ramos (Podemos), também é alvo de buscas pela polícia, assim como o suplente de vereador Ary José de Oliveira (PRTB).
Procurada, a gestão do prefeito Marcelo Lima (Podemos) não havia dado retorno até a última atualização desta reportagem. O g1 também tenta localizar a defesa do vereador e do suplente.
O prefeito afastado Marcelo Lima (Podemos), ao lado do suplente de vereador Ary José de Oliveira (PRTB); à direito, o presidente da Câmara Municipal, Danilo Lima (Podemos).
Montagem/g1/Reprodução/Redes Sociais
Com o afastamento do prefeito, quem assume o comando da cidade é a vice-prefeita, Jessica Cormick, do Avante. Aos 38 anos, ela é sargento da Polícia Militar e está no seu primeiro cargo público eletivo.
LEIA TAMBÉM: Quem é a vice-prefeita que assume o comando de São Bernardo após afastamento do prefeito
Na operação, batizada de Estafeta, foi preso em flagrante o empresário Edmilson Carvalho, sócio da Terraplanagem Alzira Franco Ltda., que tem contrato com a prefeitura. Na casa dele, a PF apreendeu R$ 400 mil. (Veja foto abaixo.)
Também foi preso Antonio Rene da Silva, que é servidor da Prefeitura de São Bernardo e atua como Diretor de Departamento na Secretaria de Coordenação Governamental. Havia um mandado de prisão contra ele.
A defesa deles ainda não foi localizada.
Dinheiro apreendido pela PF nesta quinta-feira (14), em endereços ligados a empresários e servidores que participavam do esquema de corrupção em São Bernardo do Campo (SP).
Montagem/g1/Reprodução/TV Globo
Apreensão de R$ 14 milhões
De acordo com a PF, a investigação começou no mês passado a partir da apreensão de quase R$ 13 milhões e US$ 157 mil em espécie - totalizando os cerca de R$ 14 milhões - na posse de um servidor público considerado o operador do esquema e que está foragido - há um mandado de prisão decretado contra ele.
O dinheiro foi encontrado por acaso: a PF estava num prédio no dia 7 de julho para prender outro alvo e abordou o servidor, que se chama Paulo Iran e é auxiliar legislativo da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
Os policiais e encontraram R$ 583.300,00 no carro dele. Depois, numa sala no mesmo prédio, apreenderam R$ 12.278.920,00 e US$ 156.964,00. A reportagem tenta localizar a defesa dele.
Dinheiro apreendido pela Polícia Federal com servidor da Alesp no dia 7 de julho
Divulgação/PF
Na época, ele não chegou a ser preso, mas os agentes se debruçaram na análise do celular dele e descobriram uma relação muito próxima e direta com o prefeito da cidade.
Segundo a polícia, o servidor pagava contas do prefeito, da esposa e da filha dele.
Paulo Iran atuava como assessor do deputado Rodrigo Moares (PL), que informou, em nota, que irá exonerá-lo do cargo.
"Assim que tomei conhecimento através da imprensa de investigações e suspeita de envolvimento do servidor Paulo Iran em qualquer questão que envolve investigações na cidade de São Bernardo já tomei as devidas providências de exoneração para manter transferência, ética e moral para as devidas investigações. No meu mandato não aceito qualquer suspeita de corrupção ou conduta indevida", disse o deputado.
A PF cumpre ainda 20 mandados de busca e apreensão e medidas de quebra de sigilos bancário e fiscal nas cidades de São Paulo, São Bernardo do Campo, Santo André, Mauá e Diadema.
As ordens judiciais foram expedidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e incluem ainda afastamento de cargos públicos e monitoramento eletrônico de investigados.
Os envolvidos poderão responder por organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e corrupção ativa.
Na manhã desta quinta-feira (14), os prefeitos do ABC Paulista iriam se reunir com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), na 168ª Assembleia Geral do Consórcio Intermunicipal Grande ABC.
O evento aconteceria em Santo André, mas foi cancelado logo depois da divulgação da operação da Polícia Federal. O prefeito de São Bernardo também participaria da assembleia.