Cardeal e especialistas em Igreja Católica negam haver conspirações em escolha de novo papa, mas apontam algumas semelhanças com ganhador do Oscar "O Conclave". Francisco afirmou, após eleito, que houve conspiração para tentar barrar eleição de Bento XVI em 2005. Conclave para escolher sucessor de papa Francisco é considerado um dos mais indecifráveis de que se tem notícia.
Jornal Nacional
Esqueça — até certo ponto — o que você pode ter aprendido com "Conclave", o filme que retrata jogos de poder de alto nível e traições entre clérigos de túnica vermelha.
O Vaticano se prepara para a reunião secreta dos cardeais que escolherão o sucessor do papa Francisco. O conclave dos chamados "Príncipes da Igreja" deve começar entre 6 e 11 de maio, após o funeral de Francisco no sábado (26) e um período de consultas entre os cardeais, conhecidas como congregações gerais.
O filme, que ganhou um Oscar em março de melhor roteiro adaptado, é uma representação fiel em termos de figurino e encenação, mas o esquema descarado e o desenlace final são exagero não retratam a realidade — embora de fato haja algumas semelhanças—, dizem especialistas da Igreja.
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O cardeal americano Sean O'Malley, franciscano que participou do conclave de 2013 que elegeu o papa Francisco, afirmou que eleger um papa não é "algum tipo de cena de conspiração política nos bastidores sobre como eleger seu candidato".
"Durante todo o processo, tivemos uma consciência muito clara de que milhões de católicos ao redor do mundo estavam rezando por nós para que o Espírito Santo nos guiasse em nossas deliberações", disse O´Malley.
No conclave, os cardeais reunidos dentro da Capela Sistina estão proibidos de se comunicar com o mundo exterior — como o uso de telefones, televisão ou internet — e devem ficar em silêncio sobre a eleição depois do processo. Mas os detalhes, inevitavelmente, acabam passando despercebidos.
O próprio Francisco, em um livro de entrevistas publicado no ano passado, quebrou a regra de confidencialidade e admitiu que houve algumas maquinações.
"Os cardeais juram não revelar o que acontece no conclave, mas os papas têm licença para contá-lo", disse ele ao jornalista espanhol Javier Martinez-Brocal.
Ele disse ter sido "usado" em uma tentativa fracassada de bloquear Bento XVI, o favorito em 2005, com 40 dos 115 votos convergindo para ele, já que os cardeais por trás da manobra esperavam que isso abrisse caminho para o surgimento de outro candidato.
Segundo Francisco, Bento XVI, que depois foi eleito disse a um dos conspiradores: "Não brinque comigo, porque agora mesmo vou dizer que não vou aceitar (o esquema proposto), ok? Me deixe de fora disso".
O papa Francisco disse que votou pessoalmente em Bento XVI porque a Igreja precisava de um "papa de transição" após o longo papado de João Paulo II. Depois, em 2013, o próprio Francisco surgiu como candidato surpresa, após impressionar seus pares com um discurso sobre a necessidade de reforma da Igreja.
"Vamos encarar a realidade: 'Conclave', que nos leva ao coração de um dos eventos mais misteriosos e secretos do mundo, é apenas um filme muito divertido. Mas é impossível não sorrir diante de certos personagens ou situações que, principalmente aos olhos dos espectadores italianos, correm o risco de parecer paródias involuntárias", escreveu o jornal dos bispos italianos, Avvenire, em uma crítica de dezembro.
'CONCLAVE': o que é real e o que é invenção no filme ganhador de Oscar?
Conclave sem favoritos
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Desta vez, não há um favorito claro, embora as casas de apostas britânicas tenham nomeado Luis Antonio Tagle, um reformador das Filipinas, e Pietro Parolin, uma escolha de compromisso da Itália, como os mais cotados.
Robert Harris, autor do livro no qual o filme "Conclave" é baseado, disse ao jornal "The Boston Globe" esta semana que abordou o conclave "puramente de um ponto de vista secular de alguém interessado em instituições, como elas funcionam e os jogos de poder dentro delas".
"Essas figuras poderosas estão trancadas em uma das joias artísticas mais extraordinárias do Renascimento. Elas não têm permissão para falar com o mundo exterior e precisam ficar lá por dias até obterem a maioria de dois terços, e isso é simplesmente o drama mais maravilhoso em si", acrescentou.
Já o diretor de "Conclave", Edward Berger, disse que, embora o filme se passe no Vaticano, ele poderia ser sobre os jogos de poder que acontecem onde quer que haja um cargo importante a ser preenchido.
"E sempre que esse vácuo de poder existir, haverá pessoas lutando por ele. Haverá pessoas lutando por ele, apunhalando-se mutuamente pelas costas e tentando manipular seu caminho para chegar a esse poder", disse ele à Reuters em novembro.
Independentemente de quanto o livro e o filme sejam ficção, o interesse pela história aumentou depois que o papa Francisco morreu, na segunda-feira (21). A empresa de dados da indústria do entretenimento Luminate relatou que os números de audiência "Conclave" aumentaram 283% na segunda-feira, em comparação com a semana anterior.
Funeral do papa Francisco
O Vaticano anunciou que o funeral do papa Francisco será às 5h de sábado (26), 10h no horário local de Roma.
Nesta quarta-feira (23), o caixão com o corpo do pontífice foi trasladado da Capela de Santa Marta para a Basílica de São Pedro nesta quarta-feira (23) às 4h no horário de Brasília, às 9h no horário local, e ficará exposto para homenagens do público.
O traslado terá procissão que passará pela Praça Santa Marta e pela Praça dos Protomártires Romanos, sairá pelo Arco dos Sinos em direção à Praça de São Pedro e entrará na basílica pela porta central.
O funeral de Francisco será cercado por uma série de cerimônias da Igreja Católica para se despedir do pontífice. Mais cedo, o Vaticano havia informado que a cerimônia ocorreria entre sexta-feira (25) e domingo (28).
Francisco morreu aos 88 anos na segunda-feira (21). O Vaticano informou que o papa sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC), seguido de um quadro de insuficiência cardíaca irreversível.