Elas passam por consultas, exames, avaliações e, em alguns casos, enfrentam filas de adoção e até processos de fertilização. Tudo isso sem garantias. Psicóloga alerta para o risco de frustrações. Mulheres falam sobre importância do dia das mães para elas
cuidá-la
'Maternar' é o grande sonho de muitas mulheres. Algumas, no entanto, enfrentam um longo e muitas vezes doloroso percurso para colocá-lo em prática. Chamadas de tentantes, elas passam por consultas, exames, avaliações e, em alguns casos, enfrentam filas de adoção e até processos de fertilização. Tudo isso sem garantias.
Quando conseguem, muitas dizem que o período de incertezas valeu a pena. Mas quando não o alcançam ainda precisam lidar, em alguns casos, com as frustrações, já que a maternidade ainda tende a ser encarada como destino e não como escolha, segundo a psicóloga Juliana Baron Pinheiro.
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"O processo de tentar engravidar, em geral, é bastante complexo e desafiador, porque envolve muitas camadas: desde o alto investimento financeiro às oscilações emocionais e sentimentos de cada fase", diz a psicóloga.
O g1 ouviu mulheres que investiram e ainda investem no sonho de ser mãe, e que lidaram de diferentes formas com o processo. Em um dos casos, desistir das tentativas de fertilização temporariamente foi a saída para uma gravidez natural - e surpresa - aos 44 anos.
"Quando nos permitimos viver e aceitar o que estava acontecendo, engravidei", conta Elizandra Fiorin Soares.
Em outro, a adoção foi a resposta. "Desde o primeiro dia que eu peguei a minha filha no colo, eu esqueci toda a dor e sofrimento desse período de tratamentos, de tentativas", afirma Aline Carolina Pahl Stammerjohann.
A empresária de São José, na Grande Florianópolis, recebeu a criança em 2023, um mês após o nascimento da pequena Catarina, e seis anos após dar entrada no processo de adoção. Antes disso, passou quatro anos se submetendo a tratamentos médicos.
Estes processos já superados por Elizandra e Aline são enfrentados por Julia Cardoso Lohn, aos 29 anos. Ela é uma tentante recente, conta, mas já vive há três anos com a expectativa.
"Quando conheci meu esposo, essa foi a primeira pergunta que fiz pra ele, se ele queria ter filhos. Porque, para mim, isso é muito importante", comentou.
Confira as histórias completas mais abaixo.
👀 Antes de ler as histórias é importante saber...
A psicóloga Juliana Baron Pinheiro, que escreveu o livro "Maternidade Possível: Sendo a mãe que eu posso ser", diz que ainda há uma crença de que a mulher só se sente plenamente realizada ao se tornar mãe, o que pode gerar frustrações em algumas situações.
E, também por isso, pessoas que convivem com tentantes (mulheres que estão tentando ter filhos) "ajudam quando não julgam, não cobram e não opinam quando não foram solicitadas".
"Apesar de já termos evoluído muito nesse sentido, a maternidade ainda é encarada como um destino e não como uma escolha. E isso é ruim não só para as mulheres que escolhem não serem mães, como para as que escolhem, já que quando os filhos chegam, elas não se sentem realizadas plenamente o tempo todo, principalmente, no início do processo", explica.
Mulheres que sonham, mas têm dificuldades de engravidar, também podem ser afetadas psicologicamente por essa mentalidade.
"O processo de tentar engravidar, em geral, é bastante complexo e desafiador. Complexo porque envolve muitas camadas, desde o alto investimento financeiro, as oscilações emocionais por conta dos hormônios, além, é claro, dos sentimentos que surgem a cada fase".
Aline Carolina Pahl Stammerjohann e a filha (à esquerda) e Elizandra Fiorin Soares e a filha (à direita)
Arquivo pessoal
Quando não esperava
Elizandra começou a fazer processos de fertilização aos 38 anos. Após duas tentativas mal sucedidas, descobriu que tinha três linhas para trombofilia, condição clínica que aumenta o risco de trombose e perda gestacional.
"É importante considerar a idade da mulher para a coleta de óvulos bons, considerando a trombofilia. O ginecologista mostrou as dificuldades de outras mulheres e, sem a fertilização, era uma estimativa de 10% de possibilidade", disse.
Com a condição descoberta, os demais processos de fertilização incluiriam um tratamento específico para trombofilia. Mesmo assim, segundo ela, o médico não dava garantias de que ela fosse engravidar.
A partir desse momento, Elizandra refletiu sobre as probabilidades, considerou as dificuldades emocionais do processo e desistiu do tratamento.
"O processo de fertilização traz muitas expectativas, mas com uma mudança hormonal gigantesca. Unindo esses dois fatores, o emocional fica frágil. Mulheres com dificuldades para engravidar são lutas e batalhas emocionais e financeiras constantes. Mas como vale a pena quando vejo a minha filha, comenta.
Ela contou que não imaginava engravidar sem a fertilização.
"Decidimos que durante um ano não iriamos mais falar sobre o assunto da fertilização e depois desse um ano iriamos decidir se entraríamos na adoção ou aceitaríamos a questão de não sermos pais".
Nesse período, o casal passou a viajar mais e confraternizar com familiares e amigos. "Quando nos permitimos viver e aceitar o que estava acontecendo, engravidei."
Elizandra e a filha Helena, de 5 anos
Arquivo pessoal
👩🏻🍼 Dia das Mães: Para Elizandra, esse é um momento de reviver sua história e a dela. "Acredito que ela me escolheu para ser sua mãe, para eu cuidá-la e amá-la todos os dias".
"É como o doutor comentou quando cheguei ao consultório dele [após a gravidez]. A primeira pergunta foi: 'como aconteceu?', e a segunda foi uma afirmação: 'vamos cuidar bem desse pequeno milagrinho'. Acho que todas as mulheres, quando conseguem, se sentem com pequenos anjos vindos para terra aos nossos cuidados."
Sonho de infância
Aline Carolina Pahl Stammerjohann sempre sonhou em ser mãe. Com essa vontade, que já existia durante as brincadeiras de boneca, na infância, vieram também algumas idealizações - o barrigão de gestante era uma delas.
Já adulta e diante das tentativas de engravidar, ela descobriu uma endometriose. Com o diagnóstico, Aline e o marido tiveram que recalcular a rota e entraram para a fila da adoção. Do início das tentativas até o momento de pegar a filha nos braços pela primeira vez, 10 anos se passaram.
"Descobri outros problemas associados que fizeram eu ter três abortos espontâneos. Eu acredito até que foram mais, mas documentados foram três. As gestações não seguiam adiante por conta dessa endometriose. Fizemos vários tratamentos e, quando foi para fazer uma fertilização in vitro, eu olhei para o meu marido e falei: 'eu não quero isso, eu não quero passar por isso para ser mãe'".
A família começou o processo de adoção em 2017, época em que Aline coordenava um abrigo com crianças acolhidas em Joinville, no Norte de Santa Catarina.
Em 2019, ela e o marido foram habilitados.
Catarina nasceu em 3 de abril de 2023 e, cerca de um mês depois, o casal foi chamado para buscá-la.
Aline conta que sonhou com a filha dois dias antes da menina nascer. "Mandei um áudio para as minhas irmãs descrevendo ela exatamente como ela era".
"Foram seis anos e quatro meses de espera [na fila de adoção]. Eu tinha acabado de comprar uma loja quando a Catarina chegou, estava num momento da minha carreira super atribulado, mas ela chegou no dia que era para chegar".
Aline e a filha, Catarina
Arquivo pessoal
👩👧 Dia das Mães: Para Aline, significa a comemoração de um sonho realizado. "Um colo que por muitos anos passou vazio hoje está cheio de amor!"
Aline, que passou por uma histerectomia no último ano e precisou tirar o útero, diz que se sente uma "mãe completa, independente se ela veio da minha barriga ou não".
Na expectativa
Aos 29 anos, a engenheira civil e corretora imobiliária Julia Cardoso Lohn contempla o grupo das tentantes oficialmente há três meses. Mas o processo de preparação começou antes, aos 26 anos, com uma bateria de exames para descobrir se poderia ter algum problema para engravidar.
Ela descobriu um mioma uterino e endometriose e passou por um tratamento de seis meses, sendo necessário induzir a menopausa na época.
"Passei por um processo bem difícil porque foi no verão e eu tinha muitos fogachos [sensação de calor repentina], para depois fazer a cirurgia de retirada. Por mais que muito segura, ainda existia uma pequena chance de eu ter que retirar o útero", comentou.
O processo deu certo, segundo ela, e a jovem se sente "superpronta". Ela faz acompanhamentos com especialistas em busca da sonhada gestação.
"Desde novinha, eu já falava que meu sonho era casar e ter filhos. Mas com a vida adulta chegando, a gente vê que as coisas não são tão simples. Eu tinha, na minha cabeça, que a idade ideal seria aos 26. Inclusive, quando conheci meu esposo já foi a primeira pergunta que fiz pra ele, se ele queria ter filhos, porque, para mim, isso é muito importante".
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